Wanted (2009)


Não posso dizer que fui assistir a Wanted desavisada. Sabia que era o Salman no auge de sua nova onda como herói masala, que haveria muitos tiros, alguma heroína doce sempre pedindo socorro e um vilão muito mau. Mesmo tão preparada, não esperava ter reagido do modo como reagi...fiquei enjoada. Não de um modo subjetivo, foi fisicamente mesmo! Levantei me sentindo meio fraca, com um enjôo estranho ao pensar em todo aquele sangue. Não me lembro disto acontecendo comigo em relação a qualquer filme indiano antes.

Radhe (Salman Khan) é um bandido que não se prende a nenhum chefe: ele faz o trabalho se você pagar bem, fim. Radhe não tem medo da morte, expondo-se à ela constantemente — seja arriscando sua própria vida ou tirando a de outros. Há muitos bandidos na história e me perdi em todos os nomes, mas entendi que Gani Bhai (Prakash Raj) é o principal, sendo um grande traficante internacional. Nem dele Radhe tem medo, agindo de forma autônoma dentro da gangue de Golden (Aseem Merchant), braço-direito de Gani Bhai em Mumbai. O policial Ashraf Khan (Govind Namdeo) fez uma promessa a si próprio de que prenderia Gani Bhai, mas sua ação é sempre prejudicada pelas conexões políticas do criminoso. O Inspetor de polícia Talpade (Mahesh Manjrekar) é corrupto e trabalha para Gani Bhai, e também gasta seu tempo assediando Jhanvi (Ayesha Takia), interesse amoroso de Radhe. A moça gosta de Radhe, mas saber que ele é um assassino a impede de estar com ele. Temos aí herói invencível, mocinha simpática sempre em risco, um bandido muito do mal, romance, uma boa dose de patriotismo, comédia, uma pitada de drama e grandes musicais. Masala, eu te amo!

O filme é dirigido pelo Prabhudeva, o Rivaldo. Na minha nova atitude de prestigiar roteiristas: o filme foi escrito pelo próprio Rivaldo Prabhudeva e por Puri Jagannadh, que na verdade escreveu e dirigiu o filme original telugu, Pokiri (2006).

Mostrando poder.
Não gosto do Salman Khan como ator. Acho que já disse isso em todos os lugares possíveis da internet, menos aqui. Só que eu o adoro como herói masala, acho que é o tipo de papel que melhor se encaixa a ele. O verdadeiro herói masala tem que me fazer acreditar que nada pode derrotá-lo e me fazer pensar "hoho, deixa o fulano chegar para você ver só!" quando o vilão estiver aprontando. Ele não é deste mundo, mas deve me fazer acreditar que seja enquanto o filme durar. O Radhe era tudo isto e mais um pouco. A voz do Salman é inacreditavelmente perfeita para as frases de efeito que o herói precisa dizer. "Um porco sempre anda em bando. Um tigre anda sozinho". Bati palminhas e tudo.

Masala pode ser uma bagunça harmoniosa, mas é algo que levo muito a sério. O conflito entre o que o Radhe fazia para viver  — assassinatos — e a boa pessoa que ele parecia ser me tocou muito. Fiquei bastante satisfeita por a Jhanvi ter refletido tanto se era isto que ela queria para a sua vida ou não, ao invés de ser a mocinha que acha que o amor está acima de tudo e não gasta um minuto refletindo a sério sobre o que é a morte. Uma das cenas mais bonitas do filme (na minha mente doentia) é quando ela vai atrás dele para se declarar mesmo já sabendo que ele era uma espécie de bandido, mas no meio do idílio amoroso surgem vários capangas de um inimigo de Radhe e ele vai matando-os um por um. Sem dó nem piedade, tudo na base do massacre mesmo. Jhanvi assiste a tudo horrorizada e no fim, Radhe pergunta: "Você pensava que eu fosse um bandidinho, não é?". Mata mais um homem, volta e diz: "Sou um assassino. Você ainda diria que me ama? Amo você. Repense". E ela vai embora! É, ela vai pensar! Tudo bem que mais tarde não parece que ela tenha tido grande reflexões, mas ei, isto é Bollywood. A mulher ter se dado tempo para pensar é grande coisa. E eu estava com saudades do jeitinho adorável da Ayesha Takia, que não  parece passar fome para estar na tela.


Apesar de eu estar interessada na história principal de herói x vilões, o que mais me impressionou no filme foram as mulheres. Eu mudaria o nome para Wanted: Um Retrato Do Que Tem De Suportar A Mulher Indiana. A Jhanvi e sua mãe Laxmi tiveram de suportar o assédio sexual escancarado do Inspetor Talpade, e a cena do primeiro encontro deles, com aquele maldito passando a mão na menina e exigindo que ela lhe desse seu telefone, me deu um nojo enorme. Até simulação de estupro para que a mulher ficasse mal-falada e não recebesse nenhuma proposta de casamento houve. Quando realmente houve um estupro, eu já estava indignada em nível 3. A mulher não pode andar na rua em determinado horário e lugar e nem usar determinadas roupas, porque corre o risco de ser abusada. É assim que a gente tem que viver para sempre, e é o que ensinaremos às nossas filhas? Não achem que estou reclamando do filme, estou é sentindo raiva da realidade social que ele tenta retratar da forma como pode. E o que me irritava não se limitou às ações dos vilões. Quando Jhanvi está na academia fazendo os movimentos de sua aula de aeróbica e claramente fica incomodada com os rapazes observando, Radhe diz que "garotas assim fazem essas coisas  *dá uma reboladinha* por nós" . Última manifestação feminista: fiquei com a impressão de que a atriz que fazia a mãe da Jhanvi (Prateeksha Lonkar, segundo a Wiki) era da mesma idade ou mais nova que o Salman. Logo lembrei de uma entrevista da Shobhaa De e da minha musa inspiradora Shabana Azmi no Koffee With Karan, na qual a Shobhaa disse que era ofensivo mulheres de 30 e poucos anos interpretarem mães de homens de 40 (que interpretam os de 20, mas ponto para o Salman, que nunca disse a idade do personagem). Pensei na Kirron Kher, uma das minhas "mães" favoritas. Li aqui que ela tem 56 anos, tendo interpretado a mãe do Aamir Khan em Rang De Basanti. Ele tem 46. Ai ai, essas gestações dessas meninas de 10 anos. 


Desde Singham (2011) acho o Prakash Raj o melhor vilão de todos os tempos. Ao mesmo tempo em que sinto raiva dele por querer fazer coisas como explodir uma manifestação cheia de criancinhas, o indivíduo é tão engraçado que não consigo deixar de me sentir feliz por tê-lo no filme. Ele faz o vilão parecer um louco com seu ego super inflado, principalmente quando está encurralado, arregala os olhos e começa a falar sobre todas as suas conexões políticas. Talvez não seja o melhor tipo de vilão por me fazer rir mais do que causa medo, mas como rio com ele e não dele, entendo que me liguei à ideia do personagem. Céus, eu a-do-ro esse cara.

O vilão sempre rodeado de não-indianas...ai ai, Índia.
Todos os últimos filmes indianos que vi e tem algo relacionado à polícia falam de sua corrupção em um tom que exige mudanças imediatas. Não sei quantas vezes já vi cenas de policiais recebendo propinas ou torturando pessoas em Bollywood. Quando até mesmo o cinema comercial, que só quer fazer dinheiro e entreter, fala de um mesmo assunto tantas vezes, fico com a impressão de que ele esteja incomodando muito a população. Será que vai resultar em alguma manifestação? Adoraria saber de um novo efeito RDB, já que isto aconteceu antes de eu conhecer o cinema indiano e eu nunca conseguir entender bem como foi que as pessoas se mobilizaram. Aamir Khan, chama um diretor aí pra fazer um filminho transgressor! Estamos precisando.

Masala que é masala tem que ter comédia, e descontando o vizinho gordo de 50 anos da Jhanvi que pensava ter 20, adorei várias piadinhas do filme  — especialmente a do Mughal-E-Azam (1960). O Radhe pensava em si como o príncipe Salim e na Jhanvi como a Anarkali quase toda vez que a via, e logo começava a tocar Pyaar Kiya To Darna Kya. Não que eu tenha rido, só ri mesmo (e alto) do Prakash Raj. Sou louca pela velha Bollywood, então essas pequenas referências que chamam a atenção do público para os clássicos me deixam muito feliz :)

Tá, dessa cara dele eu ri.
A trilha de Sajid-Wajidé ótima para os clipes. A melhor é Jalwa, cantada por Wajid e Earl D'Souza (a Wiki que diz). É a primeira do filme e apresenta o herói: seu estilo, suas crenças, sua coragem. E descobri vendo este filme que sou fã do Govinda, coisa que eu realmente não sabia. Quando o Anil Kapoor apareceu em Jalwa, sorri. Quando o Prabhudeva apareceu, achei legal. Quando o Govinda apareceu, gritei: "GOVINDAAAAAAAAAAAAAAAA!" *olhinhos brilhando* e comecei a dançar (sentada). Amei a festa dos tiozões!

SHOW ME YOUR JALWA! \o/

Fora Jalwa, só Le Le Mazaa Le (essa tal Mahek Chahal tem um belo potencial como item girl) me chamou a atenção, mas por um motivo diferente. Não falo espanhol, mas estas legendas me pareceram um pouco estranhas:





Quase esqueci de Love Me Love Me, que me divertiu muito! ♪ Love me, love me, love me. Your mama says you love me, your papa says you love me. So love me baby, love me! ♪ Cantada por Wajid e Amrita Kak.



Não posso deixar de dizer que a melhor cena do filme inteiro é do Vinod Khanna, que pra mim é um símbolo sexual eterno (amo! amo! amo!). É uma pena que comentá-la seja entregar o filme, mas saibam que 1) O filme se transforma do nada e 2) Voltei a cena três vezes só para ver a força do Vinod.

Com uns tropeços aqui e ali que a gente permite, Wanted ainda não deixa de ser uma das maiores expressões do que o masala pode ser e lucrar no cinema indiano atual. Apesar do meu vício pelo gênero ser forte, tenho problemas com cenas explícitas de violência (normal em masalas) e esta é a parte ruim do masala contemporâneo: as técnicas são melhores que as de antigamente e a violência está ficando bastante real. Bom, pelo menos real o suficiente para me deixar enjoada no final. Mas não deixo de gostar de Wanted, talvez por trazer um tipo de herói do qual eu sentia muita falta. E que o Salman continue sendo o herói masala, que não consigo nem pensar em reclamar dele assim.

2 comments

  1. Preciso comentar que nem li o post ainda, mas aquela foto do Govinda tá me seduzindo com vigor.

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  2. Efeito Govinda — eterno.

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