Sangam (1964)

Sangam marcou um momento muito especial da minha vida: foi a primeira vez que vi Raj Kapoor em cores. Os olhos dele me encantaram em Awaara (1951), e eu jurava que eram castanhos. Ai ai, a ilusão do preto-e-branco. Os olhos do Raju são azuis! Enfim, vamos cortar um pouco da superficialidade e falar da importância do filme de hoje. Foi produzido e dirigido pelo Raj, sendo seu primeiro filme colorido. Parece que foi o filme que deu início à tendência de Bollywood gravar cenas no estrangeiro, especialmente na Suíça. Além disto, foi um dos filmes mais longos que já vi, acho que tinha quase 4 horas. E, se quem estiver lendo não quiser spoilers, é melhor passar por aqui apenas após assisti-lo.


Sunder (Raj Kapoor) ama Radha (Vyjayanthimala), que ama Gopal (Rajendra Kumar). O básico da história é isto, mas o fato de os três serem amigos desde a infância só complica mais as coisas. E, sabem o que complica mais um pouco? Sunder e Gopal são melhores amigos e amam muito um ao outro, mais do que possivelmente se amariam caso fossem irmãos. O amor de Sunder por Radha vem desde a infância, assim como a preferência dela por Gopal.



Casa comigo?
Quando sua proposta de casamento não é aceita pela família de Radha, Sunder, que é piloto, decide juntar-se à Aeronáutica para ser digno dela. O rapaz vai viajar crendo que seu amor é correspondido, não vendo quando Radha corre ao lado do avião, dizendo que não o ama (é claro que o melhor momento para dizer algo a alguém é quando a pessoa está pilotando um avião). Ocorre um acidente e ele é dado como morto, o que destroça seu amigo. Com o passar do tempo, Gopal reconhece, tanto para si quanto para Radha, que a ama. Os dois começam a viver o romance por tanto tempo esperado, e, pouco antes da família dele fazer a proposta de casamento para a dela, é descoberto que Sunder estava vivo. Ele volta e agradece ao amigo por ter cuidado de Radha, não permitindo que nenhum homem se aproximasse dela. O que o manteve vivo foi saber que tinha um amigo como Gopal e uma amada como Radha. Gopal corre para terminar com tudo e a família de Radha se sente ofendida, casando-a com Sunder logo em seguida. Mesmo protestando muito, Radha não conseguiu fazer com que Gopal pensasse nela, além de em seu amigo. Casada, ela decide que amará e respeitará ao marido acima de tudo, e realmente vemos que seu esforço para ser feliz dá frutos. Porém, tudo começa a ruir quando Sunder encontra uma carta de amor não-assinada que Gopal escreveu para Radha no passado e fica obcecado por descobrir quem é o homem que sua esposa amava.


Ó, o laço dos noivos se desfez! Quem será a pessoa a amarrá-lo?

JURA?

O clássico e sempre complexo triângulo amoroso volta a nos visitar neste filme, que é de uma intensidade asssustadora. Vou começar falando sobre Gopal, meu favorito. Ele estudava em Londres e, ao voltar para casa, teve de lidar com todo o amor que havia para si nos olhos de Radha. Foi muito difícil entender o que se passava na mente e no coração de Gopal. Ele sabia dos sentimentos de Radha, mas parecia não saber como lidar com tudo aquilo. Apenas a olhava docemente e sorria, mas nunca prometia nada à ela. Porém, havia um certo desconsolo em seus modos e naquele mesmo doce olhar que me fazia acreditar que sim, ele a amava muito. Depois de um bom tempo de filme, a suspeita foi confirmada e percebi que aquele desconsolo devia-se ao conflito emocional que encarava: a mulher que amava ou o amigo, que apreciava mais que tudo no mundo? Permiti que as emoções daquele homem me tocassem, e a incrível atuação do Rajendra manteve meu estado. O que me incomodou, como tantas vezes acontece em filmes indianos, foi o fato de o homem pensar no próprio sacrifício e na felicidade do amigo, mas não se a mulher está disposta a fazer o mesmo que ele. Como aconteceu em Chaudhvin Ka Chand (1960), não houve nenhuma conversa com a mulher. Ela ia perder o homem que amava, ser levada a outro e não seria consultada a respeito disto. Não consigo nem pensar no que eu faria numa situação destas, mas seria melhor as pessoas tomarem cuidado.

É claro que esta cena foi depois do casamento....

...e é claro que esta foi antes do casamento.
O tanto que Sunder perseguia Radha me incomodou muito. De onde se tira que perseguir alguém incessantemente é a melhor estratégia de conquista? Essas pessoas precisam aprender a entender e aceitar uma linda palavrinha: não. Também me incomodou a importância que o Sr. Raj Egocêntrico Kapoor deu ao próprio personagem, já que Sunder estava praticamente em todos os musicais! Só me lembro de um em que não estava, e foi um dos meus favoritos. Escrevendo agora, o personagem está me parecendo muito irritante, mas não foi bem assim enquanto assistia ao filme. Acontece que ele é uma daquelas pessoas expansivas, e este tipo de pessoa acaba muitas vezes ficando cega para detalhes do que está acontecendo à volta. Se falasse menos e por um segundo tivesse prestado atenção na falta de entusiasmo de Radha para com ele, ou em um único olhar dela para Gopal, talvez teria percebido que ela não o amava. Sunder somente viu o que quis, o que não deve ser um pecado tão grande quando se está apaixonado. Porém, fico me perguntando se era realmente amor, ou apenas um capricho. A perseguição era tanta, e tão pouco ele fazia para diminuir o constrangimento que ela sentia com a situação, que não consigo deixar de vê-lo como um homem caprichoso. Sunder sempre foi o diferente do trio, por não ter a mesma condição social de Radha e Gopal. Todos os fatores me levam a crer que Radha era apenas o objeto inalcançável que, um dia, um garoto chamado Sunder decidiu ter.

Comparemos:

Com Sunder
Com Gopal

      
                           X

    




Cena super natural: dez mil curiosos.
Radha foi o papel mais moderno que vi da Vyjayanthi até agora, o primeiro que não dava espaço para haver nenhum musical com pitadas de dança clássica. Ela deveria ter se imposto desde o início, já que sempre soube o que queria (deveria, poderia, ia...). A Radha pós-casamento era muito menos romântica e mais divertida do que ela era antes, o que foi uma surpresa muito agradável depois de tanto drama. Não me levem a mal, drama é comigo. Só tem que vir em doses que não me cansem muito, porque filmes indianos mexem tanto com as emoções que fico fisicamente cansada. A diversão da lua-de-mel européia de Radha e Sunder foi exatamente o que eu precisava depois de tanto ver Rajendra sofrendo. 

Vemos que Sunder chamou Gopal em sua lua-de-mel. Sério, qual é o problema desse cara?

No meio de tudo isso, o musical mais legal de todos os tempos da última semana. Com vocês, a doce Radha mostrando ao marido que ele não precisava sair de casa para ver um show de mulheres ocidentais (¬¬). Sunder, o machista.

Deus me ajude, arrumei um velho! ♪ 

Nas cenas finais, veio a postura que eu tanto esperava, com Radha dizendo que não era um brinquedo que os dois amigos jogavam de um lado para o outro. Ainda assim, não foi o suficiente. O meu estado "SE IMPONHA, MULHER!" só fica desligado com Chhoti Bahu.

Parece que Sangam significa "confluência", e as referência a rios acontecem durante todo o filme. É bem isso mesmo. Três pessoas que não conseguem se desligar, três vidas que estão sempre se influenciando. Quando Sunder havia acabado de se casar com Radha, colocou uma foto de Gopal junto à dela em sua casa. Pobre Radha.

comolidar? ._.

Sobre o final...fiquei com a impressão de que é bem óbvio para quem já conhece filmes indianos. O confronto final foi um dos que mais gostei de ver em filmes. Fiquei triste. É engraçado um filme ser tão óbvio e você continuar achando-o sensacional, cena após cena.

Músicas, músicas! Mais uma trilha de Shankar-Jaikishan (ou Jackie-Chan, para algumas pessoas) e liiindas letras de Shailendra e Hasrat Jaipuri. Todas as músicas são ótimas, apesar de algumas chamarem mais a atenção do que outras. Uma que nem está entre minhas favoritas, mas que mostra bem o triângulo amoroso, é Har Dil Jo Pyaar Karega, nas vozes de Mukesh (a eterna voz de Raj Kapoor), Lata Mangeshkar e Mahendra Kapoor. No momento, minha favorita de verdade é Yeh Mera Prem Patra Padh Kar, cantada por...Mohammed Rafi. É, já perdeu a graça todas as minhas favoritas serem cantadas por ele. Sóri ae, gente.

Bem, amo Sangam. Esta é a conclusão mais simples que consigo fazer para um filme tão longo. Até a próxima! :)

4 comments

  1. Carol, eu ainda não vi. Por isso saltei os spoilers, eheh!

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  2. Pois fez muito bem!

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  3. Finalmente vi!
    "No meio de tudo isso, o musical mais legal de todos os tempos da última semana."[2]
    Assim que o filme acabou, voltei a colocar essa cena. É a melhor de SEMPRE!!
    <3
    Olha, vou fazer um top de 'galãs' chatos de Bollywood e esse Sunder aí vai estar em nº 1...

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  4. Sim, é o máximo! Você viu aquela entrevista da Vyjayanthi que postei no Filhos de Helen? Lá ela disse que é o clipe favorito dela! *-*

    Dou todo o apoio, apesar de achar que tem muita gente pior do que o Sunder. Li uma fofoca que a Vyjayanthi e o Raj tiveram um caso na época do filme e alguém de algum blog sugeriu que talvez por isto a Radha repentinamente tenha caído de amores pelo Sunder, que virou o centro da história. Como acho o Raj Kapoor bem egocêntrico, não duvido nada dessa história...

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